O Núcleo de Estudos e Pesquisas em Materiais da Universidade Federal da Paraíba (NEPEM/UFPB) e a Polícia Federal realizam, em parceria, um projeto que tem como objetivo desenvolver tecnologias para identificar fraudes tanto em fases do processo de licitação quanto na execução de serviços de engenharia na área pública, além de contribuir na formação de recursos humanos qualificados.
O projeto “Desenvolvimento de tecnologias e formação de recursos humanos em engenharia legal destinados à automatização aplicáveis a análises de conformidade de obras públicas” foi desenvolvido a partir de demanda da PF e foi aprovado no edital público do Programa de Cooperação Acadêmica em Segurança Pública e Ciências Forenses (PROCAD – Segurança Pública e Ciências Forenses), promovido pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES).
No projeto atuam professores, alunos e pesquisadores das áreas de ciências da computação, engenharia de materiais e química da UFPB, do Centro de Tecnologia, Centro de Energias Alternativas Renováveis e do Centro de Informática. Há também a colaboração de pesquisadores da Universidade Federal Fluminense. O professor Sandro Marden Torres, presidente da Agência de Cooperação Internacional (ACI) da UFPB, é coordenador do projeto e explica que a área de atuação da UFPB está definida em duas principais linhas, uma voltada para computação e outra para a área de materiais.
Na área de materiais, a atuação dos pesquisadores está na criação de tecnologia capaz de analisar parâmetros de desempenho, propriedades e composição que definem se um material está em conformidade com o especificado para determinada obra pública, sem a necessidade de extração de amostras que danifiquem grandes áreas construídas.
De acordo com o Chefe do Setor Técnico-Científico da PF na Paraíba (SETEC), o perito criminal federal José Alysson Medeiros, o PROCAD visa estimular alunos a desenvolverem pesquisas que atendam aos problemas da criminalística, de forma que, segundo ele, os desvios de recursos na engenharia de obras públicas podem ser apontados considerando a qualidade dos materiais utilizados, quantidades e valores.
“É importante porque uma das etapas de investigação que cumprimos enquanto peritos de engenharia é, justamente, analisar a qualidade dos materiais e das obras, então com essa parceria acadêmica a gente vem buscar os melhores profissionais da Universidade, com laboratórios, com equipamentos de ponta, para nos ajudar a solucionar crimes e apontar desvio de recursos”, disse José Alysson.
O professor Sandro Marden explica o diferencial que os equipamentos do NEPEM oferecem para o atendimento de grandes demandas técnicas de empresas ou instituições, como é o caso da Polícia Federal.
“A vantagem de você ter esses equipamentos de perícia de engenharia é que você vai profundamente na gênese do material para poder desenvolver ferramentas que tenham forte fundamentação científica. E essa fundamentação será incorporada em aplicativos, dispositivos para avaliar a qualidade dos materiais do ponto de vista da investigação pericial. Muitas vezes você, aparentemente, não vê nada, mas, quando você usa uma técnica mais aprofundada, acaba identificando algo”, esclareceu Marden.
Para o projeto junto à Polícia Federal, as ferramentas que estão sendo desenvolvidas no NEPEM serão capazes de avaliar materiais desde o aspecto químico, desempenho mecânico, até o microestrutural, tudo sintetizado de uma forma específica para o uso de peritos de engenharia. Em princípio, o foco está na análise dos elementos construtivos que são mais comuns: argamassas e concreto, devido à vasta possibilidade de aplicação destes na construção civil. A partir daí será possível escalonar para outros serviços, associados, normalmente, a atitudes fraudulentas.
Um dos equipamentos do NEPEM que estão sendo utilizados no desenvolvimento do projeto é o difratômetro de raio-x, que permite a avaliação da estrutura cristalina dos materiais e a ordenação atômica, o que, segundo o coordenador Sandro Marden, pode ser chamado de o “DNA” dos materiais.
O Vice-Diretor do Centro de Energias Alternativas e Renováveis, Marçal Rosas Florentino Lima Filho, que também contribui com o projeto, acredita que a atuação da UFPB junto a outras instituições abre novas perspectivas de atuação acadêmica.
“A Polícia Federal veio buscar junto da UFPB um suporte para a gente trazer os conhecimentos acadêmicos e científicos. Do ponto de vista de novidade, o Centro de Energias Alternativas e Renováveis se credenciou como unidade Embrapii, que tem também a possibilidade de interagir com o setor privado e pode celebrar negócios com empresas privadas, dar uma agilidade maior pra gente firmar convênios e parcerias com essas empresas”, afirmou o docente.
Automação contra fraudes
Além do desenvolvimento de ferramentas para análise de materiais, o projeto da UFPB aprovado pelo edital PROCAD tem atuação na área de informática para a criação de ferramentas tecnológicas e softwares. A aluna do Mestrado do Programa de Pós-graduação em Engenharia Mecânica, Cecília Freitas Vieira Couto, sob orientação do Diretor do Centro de Informática, Prof. Lucídio Cabral, é bolsista do projeto e desenvolve uma ferramenta para analisar as licitações das obras, identificar elementos evidentes na indicação da potencial fraude, e, a partir dos dados das licitações, apontar possíveis irregularidades de forma automatizada, visando ampliar a capacidade de avaliação dos peritos federais diante do grande volume de documentação nos processos licitatórios
A bolsista conta que os principais dados a serem analisados são retirados do sistema do Tribunal de Contas da Paraíba, como quantidade de concorrentes, o valor da obra e o que foi contratado pelos órgãos públicos. O sistema possibilitará a identificação de possíveis fraudes de acordo com a associação entre empresas e cenários de falsa concorrência, nos quais empresas ingressam nos processos de licitação apenas para validar uma empresa cuja vitória no certame já estava previamente decidida pelos agentes participantes da licitação.
“Às vezes, existem algumas relações que nós humanos não conseguimos identificar na hora, mas o computador, fazendo todas as análises, consegue ver uma relação e daí tirar uma conclusão. Então, a ideia de usar a informática para isso é exatamente essa: agilizar o processo que não seria possível fazer manualmente e também identificar relações que não seriam vistas, pelo menos em um primeiro momento”, esclareceu a mestranda.
O Núcleo de Estudos e Pesquisa em Materiais (NEPEM) é uma iniciativa que nasceu nos editais FINEP, empresa pública do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI). Trata-se de um projeto interdisciplinar que dispõe de equipamentos, corpo técnico e prédio próprios, com a ideia de conectar a Universidade com demandas de grande impacto para a sociedade na área de materiais, sendo fomentada por pesquisas ou quando acionado por empresas e instituições.
A atuação do núcleo abrange as áreas de nanociência e nanotecnologia para o desenvolvimento de novos produtos, avaliação ambiental, integridade estrutural, podendo contribuir com muitas frentes que necessitem de pesquisadores com experiência nas diversas áreas pertinentes.
Além do difratômetro de raio-x, o NEPEM conta com um microscópio eletrônico de transmissão, com o qual é possível avaliar materiais em uma escala muito pequena, tanto do ponto de vista estrutural quanto material e morfológico. Há ainda um microscópio eletrônico de emissão de campo capaz de aumentar 1 milhão de vezes e que possui um analisador químico e estrutural. São três ferramentas complementares que, aliadas aos demais equipamentos existentes na UFPB, transformam o núcleo e a Universidade em um centro capaz de agregar demandas complexas e promover o desenvolvimento de tecnologias com fundamentação científica essencial para a indústria e a sociedade.
*Com informações Ascom